sábado, 20 de novembro de 2010

Manhã

Manhã de sábado. O sol quente ilumina minha face sonolenta que nota a beleza do ambiente iluminado. As árvores e prédios são obstáculos para a luz, que os desenha de forma exímia no chão de concreto ao lado. O céu se abre num azul exuberante, marcado por escassas nuvens vistosas.

Todo esse cenário que há pouco substituiu a escuridão é ainda muito silencioso. Não há muitos carros ou pessoas nas ruas, é cedo. Avenidas grandes estão praticamente vazias e as poucas lojas que não estão fechadas abrem-se timidamente, apenas. O vento canta silenciosamente, batendo em meu rosto sob o farfalhar das folhas que voam.

Que paz! Não parece que apenas amanheceu um novo dia, mas sim uma nova vida. Sinto meus olhos arderem quando encaro a luz amarela que brilha forte, é o ardor de olhos que nunca antes foram abertos. Posso sentir cada minúcia do ambiente que se forma. Solitário caminho como se estivesse dando os primeiros passos.

A luz penetra no profundo da alma e parece expurgar dela o passado, a loucura. A música alta que zumbia em meus ouvidos, a bebida que me deixava leve (e agora com leve dor na cabeça), o extravasamento. Toda essa agitação maluca parece nunca ter existido agora sob esse céu. A tranqüilidade é tão intensa que pareço ter dormido por várias noites e não por apenas quatro horas e alguns minutos. Pareço ter nascido mais uma vez.

Trago para a mente algumas antigas memórias e informações enferrujadas. Em breve adentrarei uma sala para tentar redigi-las, provar conhecimento. O que poderia me preocupar, no entanto, parece insignificante perto desse mundo que percebo, tão belo e, apesar de silencioso, semelhante a uma música muito bem composta e executada, na qual o caos e a ordem são indistinguíveis.O sol brilha e me ilumina cada passo. Nada mais tenho em mente.

“The sun will lead us, our reason to be here.” - Yes - The Gates of Delirium

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Noite

Sou eu este que agora olha para a escuridão, enquanto escuto o peculiar barulho dos carros que passam na rua ao lado. Tento imergir minha mente em sonhos e descanso, enquanto ela se cansa, mergulhada em objetivos, reflexões, lembranças...

Olho para um céu estranhamente laranja, através da janela encoberta por uma cortina que permite a entrada de muito mais luz do que eu gostaria. Escuto o som calmo da chuva, que lentamente se apossa do ambiente, gerando uma atmosfera melancólica e de certa forma muito confortável.

Sou eu, aquele com quem sonhei na inocência de meu passado, quando imaginava quem seria aos 20 anos. Que olhava com interesse e esperança para um futuro em que todos aqueles obstáculos seriam superados (e a maioria de fato foi). Deito-me nesse velho e macio colchão, numa cama ainda mais velha, sobre a qual me ausentei da realidade na maioria de minhas noites, que agora parecem tão breves. Quantas diferentes facetas de mim aqui já repousaram: pensativas, tristes, alegres, compenetradas em um não-lugar. No fundo, sempre o mesmo – aquele que por anos olhou para frente em busca de uma visão confortável, que a cada noite planejou crescer; apesar de por tantas delas ter deixado essas idéias dormirem e se dissiparem dentro da imensidão.

Me levanto e retruco com um grafite que caprichosamente se esconde dentro da lapiseira. Volto a deitar-me e alguns pensamentos me fogem enquanto outros aterrisam em minha mente. Há em mim certo desespero para escrever, estou cansado. Muito cansado. Não por que me dediquei a tarefas custosas hoje, mas porque o fiz durante toda a vida.

Descansarei agora meu corpo e espírito. Não quero amanhã ser tomado pelo sono, me sentir pesado para voltar a caminhar na direção do tal não-lugar. O silêncio toma agora lugar do som da água que já não mais cai. Me permitirei fazer parte desse uníssono.